Os motivos que me levam a empunhar caneta e papel sempre serão os mesmos, passe o tempo que passar, independente dos personagens, enredo, mas será sempre o sentimento latente do vazio que se completa com tinta, papel, álcool e pensamentos, que farão levantar o rosto, sacudir os cabelos, pedir outra cerveja e escrever. Minhas mãos estão cheias, minha boca está cheia, meus bolsos, meu estômago. E só o que preciso fazer é esvaziar e jorrar e atirar aos céus. Continuo detestando esse estado de espírito, essa raiva, essa irritação, mas também sei que elas são essenciais pra tirar o véu dos olhos, pra cansar a vista, pra querer mudar algo. Mas primeiro vem esse estado de chafurdar na ferida, sambar de salto agulha na própria cabeça, e mesmo assim ela não pára de produzir pensamentos e mais pensamentos, e construir planos, e demolir fantasias. Que grande fábrica eu tenho aqui dentro da mente.
Não quero direcionar essas linhas na direção de ninguém, não quero ninguém na linha, o trem vai passar, e eu serei a unica responsável por fazê-lo levar embora tudo o que eu mais queria que ficasse, independente de quantas estações passassem. Eu gosto de cores, cheiros e texturas, mas quando fico nesse estado teimo em relembrá-los todos ao mesmo tempo, em milhões de telas sobrepostas na minha cabeça. Como a gente pode ficar louco facilmente, penso eu. Logo, é só colocar um cd, beber mais um pouco e deixar a mente levar, a mão escrever e todas as pautas do mundo ainda não serão suficientes pra registrar os sons, as letras, as melodias, os enxertos, as texturas.
Pensando bem eu gosto sim desse hábito boêmio e auto destrutivo de relembrar todas as sensações, porque por mais que eu tente reprimir, sempre serei aquele que sente muito, aquele que sangra, aquela que sorri e perdoa, não por ser boba, simplesmente porque acredita que guardar rancor e mágoa é perder tempo precioso que poderia gastar fazendo muito mais coisas felizes, ou simplesmente fazer nada, só ficar parado olhando...
Olho, e olho, e olho de novo, as luzes, o escuro, o silêncio, o nada, o tudo. O ônibus, o cachorro que passa, a mulher desarrumada. Todos com mil coisas pra dizer, assim como eu, mas que não dizem, que reprimem. Eu tento, juro que tento, colocar tudo pra fora. A música ajuda, ela nunca falha. Olho o visor do celular, tento conter o impulso de olhar a pasta de fotos. Mas olho mesmo assim, porque a vontade do instinto é maior. É tão bom saber que existem coisas que acontecem que independente do que venha acontecer, nunca serão apagadas, não é mesmo? Isso deveria ser o suficiente pra garantir minha alegria pelos próximos 50 anos, tenho certeza. Mas não é, e tudo o que me faz é deixar um suspiro, e um nózinho na garganta, e a vontade de tomar outra cerveja.
Queria mesmo conseguir parar de escrever. Mas sei que quando terminar não terei dito um terço da ponta do iceberg que queria gritar. E eu sei que quando encostar a cabeça no travesseiro tudo o que eu queria escrever de verdade vai vir a tona, em poesias de rimas ricas e pobres, em músicas, em fotos.
Sinceramente, é o que eu estou mais querendo por hoje. Boa noite pra mim, boa noite pra você.